sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

Silêncios desrespeitosos


Respeito: 1. Sentimento que nos impede de fazer ou dizer coisas desagradáveis a alguém. (Dicionário Aurélio)

Guilherme era um cara de muitos amigos, parecia de boa, muito sereno, não arrumava encrenca: paz e amor. Mas Guilherme tinha um medo terrível: de que se apaixonassem por ele, sem que pudesse lhe corresponder esse afeto. Não sabia lidar, e era talvez esse não saber lidar que mais lhe assombrasse.
Um dia conheceu Caroline, uma menina linda que parecia trazer consigo um monte de novidades, ousadia e uma vontade de desbravar o mundo. Ele não era místico, mas tinha a sensação de que com a chegada repentina daquela garota tão diferente, uma nova era de aventuras e descoberta de grandes possibilidades se abria em sua vida. Não sabia se estava apaixonado, mas decerto muito atraído. Realmente se inaugurou um novo período em sua vida: excessos, hedonismo, alegrias intensas e fuga de qualquer preocupação. Mas Caroline perdeu a graça, Guilherme não se preocupou realmente em tentar entender o porquê. Talvez ela fosse muito careta, talvez o sexo tenha sido aquele “eclipse oculto” de que falava Caetano, fato é que não fluiu. Ele pouco fazia questão de encontrá-la a partir de então. Mas a garota antes tão diferente e agora tão sem graça, declarou-se para Guilherme em uma tímida mensagem de SMS. Ele sentiu um breve remorso, um desespero de não corresponder aquele sentimento. Mas não podia dizê-lo, calou-se e nunca mais se comunicou com a moça.
Eduarda foi fazer intercâmbio no Canadá. Foram seis meses marcados por muito estudo, mas também muito lazer. Conheceu gente nova, lugares novos, se divertiu e flertou à vontade. Com pouco menos de um mês para seu retorno, demorou, mas enfim foi conhecer Montreal e lá conheceu também Pierre, um francês que estava viajando a trabalho. Estavam no mesmo albergue, ele propôs apresentar a ela os lugares mais interessantes da cidade. Pareceu amor à primeira vista. Na semana seguinte ela voltou a Toronto. Pierre terminou às pressas seus compromissos profissionais em Montreal e foi visita-la. Em uma semana de romance tórrido, o francês confessou à brasileira um ousado “I love you! ”. Caroline estremeceu, o coração acelerou, estava apaixonada, mas não podia responder naqueles termos. Explicou que, para ela, “amor” não era algo que se declarava em uma semana de relacionamento, que significava um vínculo emocional mais forte e que precisava de tempo para se confirmar. Ele ficou um pouco abalado, mas o carinho que lhe foi dispensado pela moça no restante da noite acalmou sua frustração.
Caroline voltou ao Brasil, Pierre voltou à França. Pelos 3 meses que se seguiram, ele a procurava com insistência no Skype e ficavam longas horas a conversar. Mas ela se sentiu um pouco incomodada, e por mais que gostasse do rapaz, achava enfadonho aquele intercâmbio virtual, que lhe parecia um pouco excessivo. Mas a redução do contato foi mais drástica do que a moça esperava, em pouco tempo Pierre interrompeu suas iniciativas, agora era praticamente somente ela quem o procurava.
Passado um ano, Caroline tinha consciência de que aquele “amor de verão” havia marcado sua vida e por mais que a paixão de outrora não existisse, sentia pelo francês um enorme carinho. Era realista, sabia que não ficariam juntos, por isso não tinha fantasias românticas, mas a memória dos belos dias que viveram em Montreal e Toronto criava um sentimento de amizade que pouco a pouco aflorava com toda sua beleza, apesar das reduzidas trocas de mensagens.
Surgiu a oportunidade de visitar a França para participar de um evento acadêmico. Pierre morava em Toulouse, o evento era em Paris. Comunicou ao amigo animada sobre sua viagem, ele informou que infelizmente viajaria a trabalho para a Suíça.
De retorno ao Brasil, recebeu um e-mail dele se desculpando e falando sobre como ela foi importante para sua vida. Caroline lhe respondeu afetuosamente, dizendo que entendia perfeitamente, não havia motivos para se desculpar, e lhe retribuiu sinceramente os votos.
Passados dois meses, Pierre não enviou qualquer mensagem. Caroline fez aniversário, tampouco recebeu uns parabéns do amigo. Mais quatro meses se foram, ela estava vivendo uma série de problemas pessoais, a avó que lhe criara acabava de falecer. Escreveu a Pierre uma longa mensagem que lhe tomou uma noite acordada, contando todas as suas angústias, chorando a cada palavra digitada. Enviou pela rede social, mas já faz um ano que Caroline aguarda resposta.
João Paulo vivia um relacionamento muito complicado, todos percebiam que sua namorada parecia se envergonhar dele na presença dos amigos. O rapaz, no entanto, continuava a mendigar a atenção daquela que pouquíssima lhe dedicava. Mas tal assimetria não lhe passava despercebida e o desprezo lhe doía enormemente. Como consolo, procurava uma querida amiga, Mayara. Com ela confessava suas angústias e pedia opinião, sabia que a moça era sincera e com ela compartilhava seus dramas e músicas sertanejas. Quando enfim terminou um relacionamento já tão desgastado, sua amizade com Mayara ficou ainda mais forte, pareciam inseparáveis. Contava à menina sobre suas pegações e ela fazia o mesmo. Tiveram bons momentos juntos e certa vez, bêbados, até brincaram com a possibilidade de um dia eles próprios se pegarem. Nunca rolou. Gostavam-se como amigos, era o que parecia, ao menos para a garota.
Mayara estava gostando de um colega de trabalho, João Paulo se envolveu com uma menina que conheceu na balada. Até aí, tudo na mais perfeita normalidade, um pedindo conselho ao outro. Ambos começaram a namorar. Mayara agia normalmente, mas João Paulo repentinamente se afastou. Nunca mais teve notícias dele, parece feliz com sua namorada, pelas redes sociais. O rapaz nunca se explicou, a Mayara só restava especular: teria o ciúme da namorada o feito trair a amizade?
Larissa e Marcelo participavam do mesmo grupo de jovens na igreja. Ela era muito ativa, ele nem tanto. Mas pouco antes de se aproximar de Larissa, Marcelo passou a assumir um monte de tarefas. A jovem as vezes se questionava se ele teria feito aquilo para chamar sua atenção. Mas buscava afastar pensamentos tão egocêntricos. Fato é que poucos meses após iniciarem namoro, ele se afastou da igreja alegando estar muito atarefado. De fato, ele assumia muitos compromissos, e muitos hobbies aos quais atribuía status de compromisso.
Com cinco meses de namoro, Marcelo pediu Larissa em casamento, ela achou precipitado. Sua vida estava um caos, acabava de assumir um emprego, após uma demissão que não deixou de ser um pouco traumatizante e fato era que se encontrava muito infeliz com seu novo trabalho. Na igreja, buscava algum conforto para sua angústia, e em Marcelo também, por um tempo... O papo de casamento se mantinha, assim como as ligações telefônicas diárias. Larissa não gostava nada de falar ao telefone, preferia estar junto de seu namorado, que cada dia alegava estar mais atarefado. Ela lhe comunicou isso. Ele passou a ligar menos e a encontra-la ainda menos. Já sentia que não havia sequer um namoro de fato entre os dois, e Larissa se perguntava “Como pode nessas condições querer falar em casamento? ”. Ela dava muito valor ao casamento e aquela banalização lhe soava quase como uma blasfêmia. Mas não durou muito.
De repente, o que era quase diário, ou espaçado por no máximo dois dias, desapareceu por duas semanas: Marcelo parou de telefonar. Larissa se sentiu triste, decepcionada, sabia que com quase um ano de namoro, a relação estava desgastada, mas não esperava aquilo. Não resistiu e ligou para ele perguntando se queria terminar ou o que diabos havia acontecido para merecer tão longo silêncio. O rapaz contornou, disse que estava sem tempo, muito ocupado e por isso não estava fazendo as ligações, pediu para se encontrarem e conversarem. Ela pediu que Marcelo a telefonasse no próximo final de semana para marcarem. Na verdade, queria testá-lo. Ele não ligou.






                                                                              Mariana Penna, 2016. 

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