quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Infecção Viral

           “Tento dormir, mas é difícil. Se deito virado pro lado esquerdo, meu nariz esquerdo entope, se viro pro lado direito, é a vez do direito entupir. Na minha garganta sinto um misto de coceira e ardência. O tempo inteiro me pergunto: quando essa gripe horrível vai embora?”
            E Fulaninho continuou pensando em seu estado, até o efeito de um exaustivo dia de trabalho abaixo de febre, o fazer adormecer. Mas enquanto Fulaninho dormia seu sono nada confortável, muitas coisas as quais ele não fazia ideia de que aconteciam, operavam em seu corpo...

            - Oh merda! Lá vem chegando esses agentes externos pra ditar as regras de como nossa comunidade deve funcionar! – bradava Complexo de Golgi.
            - Pois é, mas fazer o que se os núcleos seguem as regras deles acreditando no melhoramento da produção celular? Eu não acredito, e pra falar a verdade, já ouvi dizer que algumas células inteiras foram destruídas devido ao excesso de produção do material estrangeiro, e para o estrangeiro! – disse um pequeno Lisossomo.
            - Exatamente Lisossomo, esses Vírus não tem nenhum respeito pelos locais, vem aqui só tirar proveito, inibem a nossa produção e passam a realizar a deles, sem ter o menor conhecimento das nossas necessidades, e depois ainda corremos o risco deles nos consumirem até a exaustão, vão embora nos deixando a mercê das Enzimas e seu trabalho funesto de livrar-se dos nossos corpos mortos.
            - Ai Complexo de Golgi e Lisossomo, me admira vocês terem uma ideia tão distorcida dos últimos acontecimentos! O que eu sei é que os agentes externos melhoram a vida de muitas células por aí, nós ficaremos no subdesenvolvimento para sempre se eles não vierem nos dar uma mãozinha. Eu até reconheço o fato de alguns Vírus não serem muito éticos, mas estes estão sendo identificados e será exigido que melhorem sua ação, mas ainda assim, a atuação deles não é tão negativa, já que isso dá trabalho aos Leucócitos que andavam meio inativos faz um tempo atrás.
            - Logo se percebe o quanto Senhor Centríolo está engando – disse Mitocôndria, trabalhadora da área de produção de energia – os Leucócitos estavam bastante ativos realizando a limpeza cotidiana do Organismo, agora estão como loucos tentando reduzir os estragos causados pela ação dos vírus. E espero eu que parte dos Leucócitos sigam de forma mais radicalizada, e expulsem logo esses vírus do Organismo.
            - Você Mitocôndria, é uma radical acrítica! Esses Leucócitos loucos os quais tanto admira, ao invés de realizarem seu trabalho estão agindo contra o avanço do Organismo, e eles sim devem ser impedidos antes de provocarem reais estragos no sistema como um todo. Vocês não entendem que para progredir precisamos de algum sacrifício, e sejamos realistas, a produção aumentou enormemente nas Células onde esta passou a ser gerida pelos Vírus.
            - A única questão, e que você esquece de mencionar, é qual a utilização dessa produção, e o porquê disso nos trazer algum avanço! Afinal toda a produção tem por função única expandir o Império dos Vírus por outras células!
            - Mas vocês não têm paciência, a melhora vem aos poucos, em breve poderemos reconhecer os resultados!
            E a reunião dos Vírus com o Núcleo Celular chegou ao fim. As organelas ansiosas aguardavam Núcleo proclamar a decisão. E assim foi feito:
            - Depois de uma longa conversa com os Senhores aqui presentes, decidi que será vantajoso para toda a comunidade aderir ao sistema de produção que os Vírus me propuseram.
            As organelas se manifestaram, agitaram-se, contestaram. O Núcleo pediu calma e em seguida passou a explicar as tais vantagens que a associação traria. Os argumentos não foram muito diferentes dos argumentos de Centríolo, mas foi Núcleo, o administrador central quem os disse. Aos poucos as Organelas se acalmaram e a paz voltou a reinar na célula, algumas é claro persistiram com sua rebeldia, não podendo, no entanto, lutarem sozinhas.


            Mas Fulaninho acordou, ainda era quatro horas da manhã e ele só precisaria levantar às cinco.
         “Cof, cof! Arrrrghh! Chiiiiiinn! Eca! Grande merda essa gripe! Tomara que meu corpo consiga se liberar o mais cedo possível, antes que eu precise faltar e ser descontado no serviço! Ah! Droga, febre! Por isso meus olhos parecem pesados! Vou tomar um antitérmico rápido, pois talvez ainda haja tempo de baixar a temperatura”.
            E passadas duas horas Fulaninho se sentia um pouco melhor, já vestido em seu uniforme, tomou o ônibus para a fábrica da Nestlé, onde trabalha na área de limpeza.




                                                                                                     Mariana Penna (2004)